sexta-feira, 1 de julho de 2011

Bloco 11, apartamento 25

Via mais claramente os muros acinzentados, à medida que ia me aproximando. Passou por mim um leve medo de ser barrado, no caso de você ter deixado meu nome na portaria com o aviso de me impedirem de entrar, caso eu aparecesse. Mas esse pensamento me fugiu rapidamente, no momento em que olhei para o porteiro e ele estava com o sorriso simpático de sempre, seguido do “boa noite” que significava que se lembrava de mim e que eu poderia seguir em frente, sem mais cerimônias. Sorri de volta um sorriso sem dentes, nervoso, sem prestar muita atenção. Subi as escadas com pressa de quem sabe que, se demora mais do que aquilo, desiste. Chego à sua porta ofegante e já nem sei mais se foram as escadas ou o que está por vir. Hesito um instante antes de tocar a capainha, preciso bolar o que falar. O quê não é o grande problema, mas como. Eu precisava te dizer como sou mentiroso quando nos esbarramos por aí e eu digo que estou bem. Como eu me sinto canalha começando e terminando relacionamentos semanais só porque não acho em outras nada de você. Queria dizer como sinto sua falta e como fica difícil de respirar quando, por força do hábito, disco seu número no celular sabendo que não há mais sentido em te ligar. Precisava falar do meu arrependimento por não ter feito nada enquanto te assistia partir. Eu deveria ter tentado mais, insistido, te segurado pelo braço, te proibido, te xingado, talvez até implorado, mas nada fiz. E me arrependo. Um turbilhão de pensamentos me invadem por segundo. Eu paro, tento respirar um pouco, e me dou conta do quão ridículo eu pareço ali, parado em frente à sua porta, as mãos tão suadas quanto as de um principiante momentos antes de encontrar seu amor colegial. Eu poderia ter te dito que te buscaria onde quer que você fosse, que te procuraria, que você não se livraria assim tão fácil. Poderia ter te acusado de ser medrosa por estar fugindo, porque fugindo as coisas são mais fáceis. Mas não o fiz, porque havia também o meu medo. Meu medo de falar sobre o que sinto, esse jogo todo de ter que esconder inseguranças um do outro. Eu precisava dizer como fui orgulhoso e inseguro, mas eu precisava dizer de um jeito esperto, pra assim não parecer tão emocional, você sabe. Eu acho que estou sendo idiota, que já deve ser um pouco tarde, vez que uma garota como você não fica muito tempo sem um novo cara. E me sinto ridículo, de novo. Agora eu me odeio por esses olhos lacrimejando que deixam aparecer aquilo que me esforço tanto pra esconder, e odeio essas pernas bambas e esse sangue borbulhando na veia e as palavras que ensaiei se afastando da minha mente na medida em que a velocidade das minhas batidas aumenta. Eu me arrependo no mesmo instante em que toco a campainha pela primeira vez. Tudo foge da minha cabeça e eu não tenho a mínima noção do que vai ser se você abrir essa porta agora. Eu toco a campainha pela segunda vez e me arrependo de não ter esperado mais um pouco no intuito de não parecer tão desesperado. Agora eu já não tenho mais como segurar as lágrimas que me escaparam só em imaginar você abrindo a porta, você nas suas pantufas e seu pijama de bolinhas roxas. Eu penso em descer as escadas correndo e fingir que nada aconteceu, mas agora já é tarde, já deve haver alguém vindo, e isso seria coisa de criança  porque, claro, eu na sua porta aos prantos e morrendo de medo não soa nem um pouco infantil, imagina . 20:41, você já deveria ter chegado da aula de inglês. Talvez você esteja em alguma festa dançando, bebendo e se divertindo com outro cara. Ou talvez você esteja numa sala de cinema, como de praxe. E com outro cara. De repente me veio um pouco mais de medo, só que dessa vez foi o de ter te perdido pra sempre. Eu me recomponho, imaginando que agora alguém vá abrir a porta: ela não está. Quer deixar recado? Esperar? Passar outra hora? Nenhuma das alternativas. Passado esse surto de coragem, eu nunca conseguiria te dizer todas as coisas que ensaiei. E mesmo que eu quisesse deixar recado, além disso não fazer o menor sentido, eu sei como na sua casa ninguém se lembra de cumprir com esse pedido. Com já muito pouco restando de esperança, eu insisto por uma terceira vez. E ainda não há som nem sinal algum de que alguém venha até mim. Eu olhei à minha volta e tudo parecia tão abandonado. As escadas vazias, o barulho dos televisores baixinho vindo de dentro dos apartamentos vizinhos, as pessoas trancadas. Eu abandonado. Só então eu me convenci de que não havia ninguém em casa. Eu me conformo e até sinto uma pontinha de alívio por ter me livrado dessa, quando a minha razão consegue falar mais alto  você sabe, fugir é mais sensato . Eu sinto que é melhor eu me apressar pra evitar que você me pegue no flagra, caso você chegue de onde quer que você esteja. E assim, você jamais vai saber sobre a cena deplorável dessa noite. Não tem ninguém pra te dizer que eu estive lá, que eu procurei por você, e nunca vai te passar pela cabeça todas as coisas que eu tinha pra te dizer. Volto a guardar tudo pra mim e a única coisa que me resta, tendo esse meu orgulho vindo de novo à tona, é tentar esquecer o vazio que a sua falta me traz. E você, que tanto reclamava da minha falta de sensibilidade, jamais vai saber das lágrimas que chorei só pela ansiedade de falar dos meus sentimentos pra você. Ninguém vai te dizer como eu paguei de pirralho, nesse andar abandonado, esperando você abrir a porta, com os meus sentimentos que tanto escondi, todos reunidos pra te mostrar, e minha esperança toda atada ao simples fato de você atender a capainha. Ninguém em casa.

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