Pensarei assim, até que cometas tua primeira omissão, quiçá
tua primeira inverdade – se é que já não as fez e só irei eu descobrir com o passar
do tempo que nos trará a maldita intimidade – e será para mim catastrófico –
para dizer-te o mínimo – desfazer a bela imagem que minha mente, irremediavelmente
imaginativa, criou de ti. Por acaso não alertei a ti desde o princípio sobre quão
difícil é minh'alma? Não seria
diferentemente difícil arrancar-me as ideias uma vez já enraizadas em minha
cabeça, nem tão fácil seria explicar às taquicardias que invadem-me e encharcam-me
as artérias por conta das emoções associadas a tais ideias que me
deixassem, pois já não existem mais ideias e o que ficará de ti será somente o
que é real.
Não poderei a ti atribuir culpa alguma, vez que, como de
costume, fui eu a responsável por toda esta confusão! Fui eu a querer-te primeiro
por atribuir-te a missão de ser completamente incomum entre os demais cavalheiros,
ou desejei-te e, por isso, atribuí a ti tal missão: e o que importa a ordem quando
tudo se trata de imaginação? Pois são os que vivem da realidade os que
preocupam-se com os números, com as ordens, as ciências e com a lógica! A mim
não importa nada se não minha própria tristeza e dor.
Perdoe-me, nobre cavalheiro. Não foi por segundo algum minha
intenção fazer-te perder teu precioso tempo com minhas ladainhas infelizes.
Perdoe-me e esqueça-me, pois nesse mundo onde, paradoxalmente,
a realidade reina embora a mentira predomine, já nem existo mais. Perdoe-me,
cavalheiro, que nada disso é para mim.
Perdoe-me se fujo por saber que, se fico, tudo só se tornará
pior, alargando-me a dor que carrego no peito e que, compreenda, já não é lá
muito modesta.
Oh, quão abominável és tu, querida realidade.
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