Nunca há ninguém e isso é coisa com a qual, eu sei, já devia
ter me acostumado há séculos. Mas quando todo mundo sai de perto, aí é certo,
meu desespero. O vazio se acentua, a solidão me traz de volta o medo quase louco
e quase cego de sair dos trilhos de uma vez. O medo de ficar sozinha em casa,
que nem quando criança me assolava, agora me devora por inteiro, tremendo cada
centímetro de minhas pernas curtinhas, cercadas por meus próprios braços. Não é
medo do estranho, do bandido arrombar minhas janelas. Nem medo dos monstros
embaixo da cama, dentro do guarda-roupa, do eco do barulho de pés no piso da
sala, dos passos apontando pra o topo da escada... É medo de mim.
Senta aí que eu vou te dizer como você, moço bonito, que se
preocupa tanto comigo, é a única sombra que tenho pra papear. Eu vou te
dizer como estou só, e como me dói não ter ninguém além de mim pra ouvir o que
eu tenho pra falar. Moço, eu perdi tudo, foi tudo embora, e comigo só ficou o
medo de perder a lucidez que me resta também. O medo de me tornar alguém que
não sei mais quem, alguém que desconheço. Moço, eu perdi tudo, e só me resta
desamor por mim, no lugar do amor-próprio, que nem sei mais se era isso, ou se
era apenas frieza. Indiferença de quem aprende a viver com pouco, de quem poda
qualquer galhinho de qualquer plantinha que tenta trazer esperança. De amar e
ser amada. E tudo é medo do amor, da vida, e de mim. É medo de que a planta,
antes tão bela e inofensiva, se transforme numa carnívora, que vá comer meus
próprios pés. E ela sempre cresce, e ela sempre come. Ela devora tudo, leva
tudo embora, e é por isso também que não se deve confiar em ninguém.
Moço, não vai embora agora, fica e espera a hora em que
eu vou sorrir de novo. Moço, me faz companhia, me dá um pedaço dessa tua
alegria, só pra que eu possa continuar meus dias até alguma coisa acontecer. Moço, fica e segura minha mão, pois só me resta o chão, e o medo de enlouquecer, moço.